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segunda-feira, abril 11, 2011

Perdas

Depois de quatro meses morando na calle Seoane, no centro de Santa Cruz de la Sierra, e ter aprendido que geladeira, ventilador e carne são importantes para a vida de um ser humano, descobri que tinha novidade mais triste guardada pra mim.

Acordei bem disposto naquela manhã de quinta feira, 10 de junho. Peguei alguns pesos (moeda boliviana) para o "busão" e para o almoço, e fui pro meu estágio no jornal El Día. Chegando lá, meu chefe me incumbiu de fazer uma matéria sobre a Primeira Feira de Automóveis de Santa Cruz. Fui até o local, peguei as informações e voltei pra escrevê - la. À 1 hora da tarde fui almoçar com meu amigo Josué, num restaurante que fica ao lado do Jornal. Voltei, terminei de escrever o texto, me despedi da galera da redação e fui pra avenida pegar o ônibus.

Peguei o “busão” da linha 77, que me deixava a um quarteirão do meu quarto. Tomei um café colombiano e fui até a lan house imprimir um trabalho da faculdade. Entrei no meu Orkut pra ver se tinha alguma coisa e pra minha surpresa... a vida tinha resolvido dar outro rumo na minha história.

Umas mensagens sem sentido que li me deixaram em choque. Corri até o “punto de llamadas” e telefonei pra minha casa. Recebi a triste notícia que meu pai tinha falecido. Fiquei sem reação. Sozinho, comecei a olhar para as pessoas e para os ônibus que estavam num engarrafamento e... ah, deixa pra lá! A vida tinha resolvido me dar uma rasteira.

O vôo pra Cumbica sairia às 4 da manhã. Sem dinheiro no momento, o don Carlos, diretor do orfanato Stansberry, emprestou 600 dólares pra que eu e o Magal pudéssemos voltar. Logo, o Netinho chegou do trabalho e nos levou até a sua casa pra aguardar o horário da viagem. Nem imagino como seria se eu não tivesse essa família da Bolívia ao meu lado, no momento em que eu perdi o chão.

Tristeza e ansiedade até às 4 da manhã. Não consegui jogar futebol no PS2 pra acalmar e o jeito foi ouvir muitas vezes “Como vai seu mundo”, do Dexter. Cheguei às 11 horas da manhã em Santa Isabel.

A vida na capital cruceña era desafiante pra mim. Tudo havia melhorado até aquela data. Eu estava no terceiro semestre da faculdade de jornalismo e tinha conseguido um estágio no jornal El Día. Também tinha comprado uma cama e uma geladeira, tinha um fogão e uma TV emprestada e sempre ia até a casa da Yara pra almoçar, porque arroz com cenoura todo dia estava me deixando seco.

Mas, como a vida tem dessas coisas, a hora de voltar pra Santa Isabel e começar tudo de novo tinha chegado do jeito mais triste possível. Os tijolinhos que eu estava construindo haviam sidos destruídos pela fatalidade da vida e o “barato” tinha ficado “loco” de vez. O ano de 2010 ficou marcado. Foi o ano que eu aprendi a perder e também aprendi que no tempo de angústia nasce o irmão.

Parece uma daquelas frases que se fala da boca pra fora, mas pude viver isso no meio dessa confusão toda. O Magal, a Yara, o Don Carlos, o Neto e a Paola me ensinaram que amizade de verdade é outra “fita” e que mesmo eu não tendo nada pra oferecer, eles estavam do meu lado. Talvez eles nem saibam o quanto sou grato a Deus pela disposição que eles tiveram em me ajudar.

Acho que amigo de verdade se conta no dedo. Melhor assim...

 “Em todo tempo ama o amigo e na angústia nasce o irmão” (Provérbios 17:17).